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Foto do escritorChristian Gurtner

SeeAdler, o Corsário


Bem vindo à bordo do pior navio da frota alemã

Esse episódio faz parte dos fantásticos podcasts mais antigos do Escriba Cafe que, por questões de direitos autorais, não estão disponíveis para download nem pelo feed, Spotify, etc, (nem mesmo pelo player fixo no site) sendo possível ouví-los somente pelo player no respectivo post.

TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

(As transcrições dos episódios são publicadas diretamente do roteiro, sem revisão, podendo haver ainda erros ortográficos/gramaticais e, assim, pedimos que marquem os erros e deixem uma nota para que possamos corrigí-los)

9 de janeiro 1917

A caminho de Buenos Aires, levando uma enorme quantidade de carvão, o cargueiro britânico Gladys Royal viu se aproximar um simples e velho veleiro mercante norueguês.

Mesmo durante a 1ª grande guerra na Europa, o Oceano Atlântico continuava relativamente seguro para os ingleses navegarem, ainda mais com o bloqueio no Mar do Norte, levantado por eles, para evitar o acesso dos alemães.

Quando estavam prestes a se emparelhar, a tripulação do Gladys Royal entrou em desespero ao ver a bandeira norueguesa baixar e em seu lugar, subir a bandeira do Império Alemão. Já era tarde demais. Antes que pudessem enviar uma mensagem de rádio, eles foram atingidos por disparos de canhões. Os homens do veleiro invadiram o convés e aprisionaram todos os britânicos que, ao serem levados à bordo do veleiro, talvez tenham até escutado o sorridente comandante dizer: “Senhores, bem vindos a bordo do Seeadler, o pior navio da frota imperial alemã”.

O Seeadler

1916, alguns meses antes.

O Império Alemão conclui que a única maneira de derrotar os ingleses, seria cortando suas rotas comerciais no Atlântico. Porém, o bloqueio no mar do norte impedia a execução de qualquer plano.

Era preciso romper o bloqueio.

Nesse sentido, eles perceberam uma carta na manga. O veleiro Pass of Balmaha, construído em Glasgow e capturado pelos alemães em 1915, era uma embarcação frágil, de aparência inofensiva — e quase grotesca — ao ser comparada com os navios de guerra. Mas acima de qualquer suspeita, era um veleiro mercante. Então, só precisavam transformar esse veleiro em um legítimo navio aliado dos ingleses ou, pelo menos, neutro. Resolveram disfarçá-lo de navio norueguês.

SMS Seeadler com as velas recolhidas

As obras começaram e o navio fora completamente adaptado. Instalaram motores auxiliares, dois poderosos canhões que podiam rapidamente ser ocultados ou usados através de plataformas deslizantes, várias passagens e compartimentos secretos e até mesmo celas para prisioneiros. Havia uma plataforma para os oficiais, que, pressionando somente um botão, ocultava todos eles abaixo do convés, possibilitando uma retomada surpresa caso o inimigo conseguisse dominar o navio.

O veleiro continuara com a aparência frágil e inofensiva, mas apertando botões e puxando alavancas, se transformava, em questão de segundos, num mortal navio corsário, batizado de Seeadler, que significa Águia do Mar em alemão. Contudo, precisavam disfarça-lo de um legítimo veleiro mercante norueguês: assim, atribuíram uma tripulação de 57 homens e 6 oficiais, todos falando fluentemente norueguês, sob o comando do Conde Felix Von Luckner, apelidado posteriormente de “O Diabo do Mar”.

Roubo de identidade

Conde Felix Graf Von Luckner

O comandante Felix Von Luckner, bem humorado e um excelente oficial, foi um condecorado herói de guerra.

Para deixar seu navio acima de qualquer suspeita, viajou secretamente até a Noruega, onde procurou por um veleiro com as mesmas características do Seeadler. A busca terminou quando ele finalmente viu um veleiro no porto de Copenhague, exatamente igual ao seu. Ele estudou todos os detalhes da embarcação, que se chamava Maletta. Conseguiu até mesmo roubar o diário de bordo.

Quando voltou para a Alemanha, falsificou documentos para o Seeadler e seus tripulantes. Espalhou fotos de cidades conhecidas da Noruega entre os pertences dos tripulantes, pregou retratos do rei e da rainha noruegueses e forjou cartas escritas em norueguês como se fossem as que a tripulação recebia dos parentes. Seus cuidados com os mínimos detalhes foram tantos, que colocou em sua cabine até mesmo uma falsa carta de um oficial britânico alertando sobre os corsários alemães.

O See Adler se transformava a cada detalhe no veleiro mercante Maletta. Os tripulantes e oficiais receberam roupas surradas e velhas com etiquetas norueguesas. Um marinheiro de nome Hugo Schmidt, se vestiria e se maquiaria como mulher para representar a esposa do comandante caso o falso Malleta fosse abordado. E finalmente, o comandante Von Luckner passaria a ser chamado de comandante Knudsen.

Estava tudo preparado para um dos maiores embustes militares das guerras modernas.

Começa a viagem

Em dezembro de 1916, o Seeadler, ou melhor, o Maletta, finalmente zarpa.

No dia 23 de dezembro, os falsos noruegueses conseguiram atravessar, sem qualquer problema, o bloqueio inglês. Um pouco mais adiante, enfrentaram um furacão, mas conseguiram se esquivar.

O caminho parecia livre para o corsário iniciar seus ataques, mas quando chegaram ao sul da Islândia, foram abordados por um grupo de inspeção britânico.

Os ingleses subiram a bordo do Seeadler e vistoriaram todo o navio. Devido à grande engenhosidade com a qual os compartimentos secretos e armas foram mascarados, eles nem sequer perceberam que boa parte do navio estava inacessível, dando a impressão de terem vistoriado o veleiro por completo. Não tinha como duvidar, aquele era definitivamente um navio mercante norueguês sem qualquer suspeita. Os britânicos, então, deram passagem para aquele que seria um de seus maiores pesadelos.

O primeiro ataque

No dia 9 de janeiro, a tripulação do Seeadler avistou sua primeira vítima: um cargueiro a vapor que transportava uma grande quantidade de carvão, com destino à Buenos aires.

Ao se aproximarem, puderam ler o nome Gladys Royal. A tripulação do Gladys Royal, não dera muita importância para aquele velho veleiro norueguês que desajeitadamente começava a se emparelhar com eles, e pensaram provavelmente se tratar, nada mais, do que troca de mensagens, avisos ou produtos entre os marinheiros.

Mas a bandeira norueguesa deu lugar a bandeira imperial alemã. Em seguida dois tiros de canhões inutilizaram o cargueiro e em poucos minutos a tripulação britânica já estava rendida.

Quando escureceu, o comandante Von Luckner deu ordem para afundar o navio britânico, apagando qualquer vestígio do ataque. Os 26 tripulantes do Gladys Royal foram trancafiados nas celas secretas.

Mais ataques e o dia a dia

Na manhã seguinte, o Seeadler iniciou novamente a caçada e rapidamente encontrou outro cargueiro britânico chamado Lundy Island. A tripulação fora surpreendida da mesma forma que a do Gladys Royal, sem ter tempo sequer para gritar. O navio fora afundado e o número de prisioneiros nas celas do Seeadler se elevara para 50.

O quantidade de prisioneiros aumentava cada dia mais. Em dois meses o Seeadler capturou e afundou mais de 10 navios britânicos. Os prisioneiros eram tratados com muita cortesia e conforto. Os oficiais inimigos tinham permissão para andarem livres pelo navio e o comandante Von Luckner, vez ou outra, brindava à saúde deles e oferecia champagne.

Conta-se que, em algumas noites, houve até mesmo festas no navio, onde alguns dos inimigos foram convidados a participar.

Navio francês vítima do Seeadler

Mas chegou o dia que as celas ficaram lotadas e não tinha como o Seeadler alojar mais homens. O comandante, então, decidiu transferir os prisioneiros para um veleiro francês e como era de se esperar, algum tempo depois, a marinha inglesa fora alertada e enviou vários cruzadores para encontrar e destruir o Seeadler. Mas tudo em vão. O veleiro corsário continuou a afundar navios no Atlântico e em seguida no Pacífico.

O fim da águia do mar

Em agosto de 1917, o Seeadler atracou na ilha Mopeha para abastecer. O que aconteceu lá foi realmente irônico. O comandante e toda a tripulação do veleiro que afundou vários navios inimigos e se esquivou de vários cruzadores ingleses, se encontrava em terra, quando, certa hora, não puderam acreditar no que viram: uma enorme onda que havia se formado, avançou até empurrar o Seeadler contra um recife, destruindo-o completamente.

O comandante Von Luckner não se deu por vencido e rapidamente reuniu 5 homens para ir junto com ele. Usando somente um bote a motor, procuraram algum outro navio ao qual pudessem dominar e continuar sua viagem. Mas depois de penosos dias, foram capturados por um a vapor britânico perto das ilhas Fiji.

O mistério

O final dessa história foi contado por Von Luckner. No entanto, o que realmente aconteceu na ilha Mopeha se tornou um mistério. Alguns dos prisioneiros americanos que estavam presentes no dia, afirmaram que não houve nenhuma onda gigante.

Nesse caso, algo muito estranho e obscuro deve ter acontecido, pois a versão da onda gigante só foi defendida pela tripulação do Seeadler.

Um dos prisioneiros afirmou que a causa foi devido à uma tentativa da tripulação explodir a base dos mastros para derrubá-los, diminuindo assim, a possibilidade de serem vistos pelos britânicos de uma distância maior, mas que a explosão fora mal calculada e o navio destruído.

Outra teoria que se popularizou em um documentário para a televisão, foi a de que o Seeadler fora vítima de uma manobra ordenada pelo terceiro tenente, que estava a bordo do navio, enquanto quase toda a tripulação e o comandante estavam fazendo um piquenique na ilha junto aos capitães prisioneiros. O terceiro tenente dera uma ordem errada quando percebeu que o veleiro estava se aproximando demais do recife e, quando percebeu o erro, era tarde demais para corrigir e o navio foi com mais força de encontro ao recife. Esse erro certamente levaria o terceiro tenente para a corte marcial, onde seria fuzilado. E para evitar isso, o comandante Von Luckner inventou a história da onda gigante.

Von Luckner com sua segunda esposa em 1938

De uma forma ou de outra, o comandante Von Luckner fora admirado e respeitado tanto pelos seus compatriotas como pelos ingleses, se tornando um lendário diabo do mar. O saldo final de suas aventuras no Seeadler foram de 16 navios britânicos afundados no atlântico e 3 navios americanos no pacífico e, com exceção de um prisioneiro que adoeceu, nenhum homem fora morto nos ataques.

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