A história da evolução da Inteligência Artificial, desde a antiguidade até os dias de hoje.
FICHA TÉCNICA
Direção, produção e edição: Christian Gurtner Roteiro: Guilherme Grazziotin e Christian Gurtner Pesquisa: Guilherme Grazziotin
Patrocínio: L3
Esse episódio foi possível graças ao apoio dos patronos e assinantes premium do Escriba Cafe
LINKS CITADOS
TRILHA SONORA
A trilha sonora desse episódio foi elaborada através do Epidemic Sound
BIBLIOGRAFIA
Canard Digérateur de Vaucanson – Vaucanson’s Digesting Duck – Grenoble, France | Atlas Obscura. (n.d.). http://www.atlasobscura.com/places/canard-digerateur-de-vaucanson-vaucansons-digesting-duck
Benko, A., & Sik Lányi, C. (2011). History of Artificial Intelligence. Encyclopedia of Information Science and Technology, Second Edition, December, 1759–1762. https://doi.org/10.4018/978-1-60566-026-4.ch276
History, B. (2005). A (Very) Brief History of Arti cial Intelligence. AI Magazine, 53–60.
Pickover, C. A. (2019). Artificial Intelligence: An Illustrated History: From Medieval Robots to Neural Networks. http://sprott.physics.wisc.edu/pickover/ai-book.html
Rouhiainen, L. (2018). Artificial Intelligence: 101 Things You Must Know Today About Our Future. https://books.google.com/books?hl=en&lr=&id=P3fSDwAAQBAJ&oi=fnd&pg=PP1&dq=traceability+system+artificial+intelligence&ots=TY5jwFvWum&sig=pu0RO5o5XUTQh36nXRz-dZTRyro
Schuchmann, S. (2019). History of the first AI Winter. In Towards Data Science. https://towardsdatascience.com/history-of-the-first-ai-winter-6f8c2186f80b
Truitt, E. R. (2015). Medieval robots: Mechanism, magic, nature, and art. In Medieval Robots: Mechanism, Magic, Nature, and Art.
Integrantes da Conferência de Dartmouth
TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO
(As transcrições dos episódios são publicadas diretamente do roteiro, sem revisão, podendo haver ainda erros ortográficos/gramaticais e, assim, pedimos que marquem os erros e deixem uma nota para que possamos corrigí-los)
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Introdução
Era o ano de 1769, diante da Imperatriz austríaca Maria Teresa e sua corte, Wolfgang Von Kempelen, um nobre com um vasto conhecimento científico, apresentava uma estranha invenção: Um autômato enxadrista.
Automatos eram uma espécie de robô que podia realizar alguns movimentos básicos sozinhos, e eram muito apreciados como fonte de entretenimento naquela época.
Porém, o autômato que Kempelen estava apresentando, fazia algo inimaginável: jogava xadrez contra humanos. E ganhava!
A máquina era composta por uma espécie de boneco em tamanho real vestido com roupas típicas turcas e um cachimbo numa mão. Na parte inferior, uma caixa toda fechada protegia toda complexidade de mecanismos e engrenagens que faziam o Turco funcionar. Antes de cada partida, o inventor abria uma porta de cada vez para mostrar esse maquinário e provar que não havia um ser humano ali dentro.
Começava a partida e, algum tempo depois, o atômato, que movia as peças sozinha, ganhava o jogo o impressionando a platéia atônita.
Aquela máquina desafiou a mente de inúmeros estudiosos da época que tentavam, a qualquer custo, descobrir como aquilo funcionava. Era algo – ate então – impensável, a possibilidade de uma tecnologia de processamento de dados ou qualquer espécie de raciocínio vindos de uma máquina. Mas o turco parecia conseguir fazer isso. Ele rodou toda a Europa se tornando um grande sucesso e sendo apresentado para multidões.
Wolfgang Von Kempelen jamais explicou como funcionava seu Autômato, mas após sua morte algumas teorias foram comprovadas ao se estudar todo o mecanismo da invenção.
Tudo dependia de um show de ilusão. A máquina era operada por algum excelente jogador de xadrez contratado por Kempelen, que se espremia dentro do pequeno gabinete e se movia para se esconder de um lado quando uma das portas era aberta para apresentar o interior para o público era aberta para o outro e vice versa. A partir daí ele controlava o turco através de magnetos e alavancas enquanto acompanhava o jogo por uma tabela iluminada a luz de velas.
O problema é que, mesmo depois do truque ser desvendado, as apresentações continuaram fazendo sucesso, afinal, ainda sim aquele mecanismo era algo incrível para a época.
O Fato é que, mesmo sendo uma ilusão, o turco foi o responsável por vários estudos e discussões que, um dia, resultariam no Deep Blue, o computador que venceu o maior enxadrista de todos os tempos, e abriria todo um caminho para a evolução de algo que o ser humano já sonhava há tempos: criar uma máquina inteligente.
Os mitos e invenções antigas
A ideia de uma máquina que realiza ações sozinha é tão antiga quanto as civilizações.
Na mitologia grega já havia um robô gigante que circulava a cidade grega de Creta 3 vezes ao dia. Esse robô, feito de bronze, foi um presente de Zeus para a sua amante Europa. O robô se chamava Talos e foi feito por Zeus para defender a cidade de Creta de invasores e impedir que os moradores saíssem da cidade sem a permissão do rei Minos.
Talos usava de enormes rochas as quais ele retirava das montanhas para atacar as embarcações inimigas que ameaçassem ancorar em Creta. A tripulação que conseguisse atracar, era dizimada pelo robô gigante que, completamente engolido por fogo, abraçava os inimigos, queimando-os até a morte.
Já na idade média também havia lendas sobre criações humanas com certa inteligência. Conta-se que em 1580, na cidade de Praga, na República Tcheca, o rabino Judah Loew ben Bezalel, procurando defender a comunidade judaica de ataques anti-semitas, usou de seu conhecimento para erguer um golem feito de argila. Na testa do golem, ele escreveu a palavra “emet”, que em hebreu significa “verdade”. Judah Loew logo notou que, após dar tamanha força física a sua criação e transformá-la em um super-humano, seria impossível manter o controle da criatura.
Inúmeras versões diferem a partir daí. Desde versões que contam que o golem, após se apaixonar e ser rejeitado, tornou-se uma máquina assassina até versões que dizem que, após sair do controle do rabino, o monstro entrou em fúria, destruindo tudo em seu caminho.
Através da história, a existência de autômatos – dispositivos mecânicos artificialmente animados que imitam os movimentos humanos ou de outros seres da natureza – intriga e fascina a mente de artistas, cientistas, filósofos e teólogos. A criação de uma inteligência artificial que possa reproduzir movimentos, ações e até emoções é frequentemente retratada em livros, filmes e outros produtos de entretenimento.
A história de Talos e do Golem são apenas lendas. Porém, a humanidade estaria preparada para conviver com esta inteligência se ela fosse real?
Autômatos
A realidade é que já existiam outros autômatos muito tempo antes do enxadrista de Kempelen.
Na grécia antiga, três séculos antes de Cristo, um engenheiro criou um robô que servia vinho e ficou conhecido como o Servo de Philon. Através de um complexo mecanismo de cordas, pesos e pressão de ar, ao se colocar o copo numa das mãos do robô, com a outra mão ele servia vinho e ainda diluia a quantidade desejada de água, costume comum na época.
Mais ou menos em 250 a.C. o inventor grego Tesibius criou uma máquina que se movia sozinha para marcar o tempo. Essa espécie de relógio era movido a água e ficou famosa em toda a Alexandria. Existem, também, registros da criação de outros modelos de relógios de água originários da China, Índia, Babilônia, Egito e Pérsia.
Vários autômatos surgiram no início do Renascimento, desde Cristos que moviam os olhos até figuras representativas de Satã que faziam barulhos e mostravam a língua.
Um dos autômatos mais conhecidos e impressionantes desta época é o relógio astronômico da Catedral de Notre-Dame de Estrasburgo, na França.
Construído em 1352, contém um galo que mexe a cabeça, bate as asas e canta em determinados momentos, além de anjos que se movem. Em 1896, o autor Fanny Coe escreveu:
“é quase como um pequeno teatro. Tem inúmeros personagens e animais com seus papéis nas cenas… As horas são anunciadas por anjos e, ao meio-dia e meia-noite, figuras de Cristo e seus doze apóstolos aparecem, então um galo dourado na torre superior do relógio bate as asas e canta”.
Ninguém sabe quem é o construtor deste autômato e, apesar de ter passado por algumas reformas ao longo do tempo, pode ser admirado até hoje na Catedral.
O Renascimento foi um período fértil em vários campos das artes, ciências e religião e o fascínio do ser humano em criar formas artificiais de vida também atingiria um dos maiores gênios da humanidade, Leonardo da Vinci.
. Em 1495 Leonardo havia projetado um cavaleiro robô. O desenho do gênio , talvez o primeiro andróide de que se tem conhecimento, era composto por juntas articuladas, braços, mandíbula e cabeça móveis e usava um sistema de polias para movimentar suas partes. Além disso, a armadura animada podia se sentar e levantar e possuía mais de um sistema de engrenagens que movimentavam a parte de cima e de baixo do corpo de forma independente. Apesar da magnitude do projeto, não se sabe se o autômato de Da Vinci chegou a ser construído.
Em 1739 um outro autômato chamou a atenção. Um relojoeiro chamado Jacques de Vaucanson apresentou, no Palácio das Tulherias, em Paris, o Canard Digérateur. Na tradução, o Pato que Digere.
O Pato de Vaucanson podia mexer a cabeça, beber água com o bico, bater as asas, grasnar, comer diretamente das mãos de alguém, além de diversos movimentos realistas. A grande atração deste autômato era que, após alguns minutos, restos de comida ingerida eram excretados por um compartimento inferior. Obviamente o pato não digeriu de fato a comida, o que acontecia era que o compartimento interno abaixo do rabo do animal era previamente preenchido com um excremento falso.
De qualquer maneira, o Pato que Digere de Vaucanson mostrou ao mundo que os limites entre o natural e o puramente mecânico se tornavam cada vez mais frágeis e que, junto com o autômato Turco de Kempelen, reservavam um futuro promissor, porém confuso, à medida que essas entidades robóticas se tornavam cada vez mais versáteis.
Inteligência
Com o passar dos anos, os robôs e outras criações artificiais que imitavam humanos e animais ficavam cada vez mais complexos, até que cientistas e inventores acabaram por fazer a grande pergunta: seria possível criar algo inteligente?
A partir de 1940, cientistas de variados campos como matemática, psicologia, engenharia, economia e ciências políticas começaram a discutir a possibilidade da criação de um cérebro eletrônico.
Em 1943, o neurofisiologista Warren McCulloch e o lógico Walter Pitts explicaram alguns modelos básicos de redes artificiais de neurônios. Inspirados na rede biológica de neurônios que compõem nosso cérebro, os cientistas explicam que as máquinas, assim como os humanos, podem aprender por repetição.
Basicamente, um neurônio, que no caso é uma unidade computacional, recebe uma informação e repassa para outro neurônio conectado na forma de um impulso elétrico. Após um período de treino, a máquina será capaz de realizar ações básicas. Esse princípio é usado atualmente nos campos de jogos eletrônicos, tradução e saúde.
E se a máquina, agora que pode aprender, fosse capaz de pensar?
Em 1950, Alan Turing, um cientista computacional inglês, publicou um artigo chamado “Computing Machinery and Intelligence” na revista Mind.
Neste artigo, Turing sugeriu que, se um computador se comporta da mesma maneira que um humano, podemos chamá-lo de inteligente. Desta forma ele propôs um teste especial para avaliar a inteligência de qualquer computador: Imagine que um computador e um humano respondem, por texto, perguntas de outros humanos que não conseguem ver quem ou o que está respondendo. Se as pessoas que fizeram as perguntas não conseguem distinguir se a resposta recebida foi escrita pelo computador ou pela outra pessoa, o computador passou por uma versão típica do que hoje chamamos de “teste de Turing”.
O Teste de Turing ainda gera muitos debates e controvérsias. Por exemplo, se um computador for programado para ser mais inteligente que um humano, ele pode acabar induzindo-se ao próprio erro pois o objetivo do teste é se equiparar a humanos. O computador pode cometer erros de digitação, inserir piadas nas respostas, mudar o assunto da pergunta e usar de outros métodos para enganar os humanos que fizeram as perguntas.
De qualquer maneira, o Teste de Turing foi um marco no estudo da Inteligência Artificial.
Porém, o uso desta nomenclatura não era reconhecida até 1956.
Conferência de Dartmouth
No verão daquele ano, na cidade de Hanover, nos Estados Unidos, aconteceu a Conferência de Dartmouth. Foi neste evento que o termo Inteligência Artificial, sugerido pelo cientista John McCarthy, foi debatido e aceito como um novo campo de pesquisa.
A conferência foi criada pelo próprio McCarthy junto com os cientistas Marvin Minsky, Nathaniel Rochester e Claude Shannon e propôs um trabalho de 2 meses na tentativa de encontrar formas de fazer uma máquina falar, formular ideias e conceitos, resolver problemas até então possíveis de serem resolvidos somente por humanos e até de se aperfeiçoarem.
A Conferência de Dartmouth foi um marco no campo da Inteligência Artificial e uniu um seleto grupo de pesquisadores que influenciariam a área pelos próximos 20 anos.
Apesar dos avanços no campo da Inteligência Artificial, houve alguns percalços.
Após muita animação com progressos no campo de Machine Translation, muito por causa do período da Guerra Fria e constantes investimentos do Exército Americano em traduzir textos russos para o inglês, iniciaram-se os primeiros problemas.
Década Silenciosa
O período entre 1967 e 1976 ficou marcado como a Década Silenciosa. Durante esse tempo, os progressos em Inteligência Artificial estagnaram. Os estudos não conseguiam evoluir para algo mais do que uma máquina executando tarefas simples e não conseguindo bons resultados em tarefas mais complexas. Alguns autores atribuem essa estagnação à falta de recursos tecnológicos na época para conseguir avançar nas pesquisas.
O Departamento de Defesa dos Estados Unidos, vendo que nenhum avanço havia sido documentado, frustrou-se. Essa frustração gerou cortes nos financiamentos de pesquisas acadêmicas na área.
Em 1973, um matemático britânico chamado James Lighthill publicou o The Lighthill Report. Esse relatório era uma avaliação da atual situação dos estudos em Inteligência Artificial e foi escrito para o Conselho de Pesquisa Científica Britânico. Num dos trechos desse relatório, Lighthill escreveu sobre o Machine Translation:
“Onde as maiores quantias foram gastas e onde se chegou a menores resultados úteis.”
O Relatório de Lighthill gerou um impacto nos estudos em Inteligência Artificial. O governo britânico cortou o financiamento de todas, exceto duas, universidades que mantinham um programa de pesquisa na área. Esse movimento gerou cortes por toda a Europa.
Após a publicação de Lighthill em 1973, iniciou-se o chamado AI Winter. O AI Winter marcou um período de escassez e frustração nas pesquisas em Inteligência Artificial.
AI Winter
Porém, a DARPA, Defense Advanced Research Projects Agency, uma agência governamental criada em 1958 como uma reação à guerra tecnológica dos Estados UNidos com a UNião Soviética, iniciou alguns investimentos na área priorizando projetos mais práticos em vez de teóricos.
No início dos anos 80, os estudos em inteligência artificial voltaram para a fabricação de produtos comercializáveis. Batizados pela indústria de “sistemas especializados”, a inteligência artificial começou a ser usada para auxiliar especialistas em suas áreas de trabalho. Foi neste momento em que foram produzidos sistemas para as áreas de finanças, médica, geográfica e microeletrônica.
Apesar de toda a animação da imprensa em criar manchetes como “IA: Está aqui” e empresas anunciando que “conseguiram construir o melhor cérebro”, os pesquisadores do campo de inteligência artificial ainda mantinham um medo de um segundo AI Winter.
E eles estavam certos.
Com o aumento das expectativas de até onde a inteligência artificial poderia chegar, criou-se um receio entre os cientistas de que os resultados das pesquisas poderiam não condizer com o esperado.
A partir de 1989, mais uma vez, os financiamentos em pesquisa no campo de inteligência artificial diminuíram, diversos sistemas especializados começaram a apresentar defeitos e muitas empresas de inteligência artificial fecharam as portas.
Assim como o primeiro Inverno, o segundo AI Winter é resultado de altas expectativas e pouco senso de realidade, levando a frustração.
Enquanto isso, o Japão fazia o caminho contrário.
Japão
A reputação do campo da inteligência artificial estava em baixa. Cientistas e engenheiros já usavam outros nomes como Machine Learning para categorizar seus trabalhos a fim de evitar o uso de AI e não perder financiamentos.
Por outro lado, as pesquisas japonesas avançavam em um movimento chamado Quinta Geração de Computadores. Com o intuito de se tornar líder na área de tecnologia e microcomputadores, o Japão investiu alto e aliou a inteligência artificial baseada na programação lógica e armazenamento de dados
Na segunda metade dos anos 90, na Universidade de Stanford, foi criado o primeiro protótipo do Google.
Conclusão
Inicialmente presente no folclore, a inteligência artificial está mais presente nas nossas vidas do que imaginamos.
Aplicativos, serviços de streaming, redes sociais, anúncios, sistemas de busca, games, enfim. Todos usando inteligência artificial para coletar nossos dados buscando sempre nos oferecer a melhor experiêwncia naquele momento.
E engana-se quem pensa que a cultura de robôs e autômatos foi deixada de lado. Hoje temos carros autònomos, robôs que limpam nossas casas, assistentes pessoais como a Alexa e a Siri.
E o futuro reserva avanços cada vez maiores e mais rápidos. Cabe a nós decidirmos de que forma vamos usar essa tecnologia.
Curioso ou curiosa para saber o que virá? Busque no Google. (ver a utilidade desse final)
Muito bom! Com o capricho de sempre!