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Foto do escritorChristian Gurtner

Dialética, a arte de discutir

Atualizado: 5 de dez. de 2020

dialética di.a.lé.ti.ca sf (lat dialectica) 1 A arte de discutir. 2 Argumentação dialogada, segundo a filosofia antiga. 3 Teoria hegeliana segundo a qual no universo tudo é movimento e transformação e as transformações das idéias determinam as transformações da matéria

Eis aí a palavra que define algo que todos fazemos — ou tentamos fazer: discutir, debater!


Em poucas palavras — e sem palavrório — vamos entender o que é a tão essencial dialética:


Caminhando de mãos dadas com as diversas linhas filosóficas, a dialética teve Sócrates como pai — ou Zênon (não se sabe ao certo) e nada mais é do que o conceito essencial para toda a criação humana e sua evolução intelectual.


Desde que o mundo gira habitado por animaizinhos com os cérebros um pouco mais desenvolvidos que o nível de segurança permite, a discussão, presente em todas as formas de comunicação humana, foi essencial para a humanidade descobrir, criar e compreender o mundo e o universo. E tudo isso se tornou mais claro quando Sócrates — ou Zênon — conceituaram a arte de discutir.


A dialética é composta de três elementos básicos: a tese, a antítese e a síntese. Onde a tese se resume na palavra inicial, no assunto em questão; a antítese vem logo em seguida como uma oposição à tese e o resultado dessa argumentação é a síntese. Complicado? Vamos desenhar:


Tese: Eu digo para você que o mundo é azul, pois vi uma foto de satélite que mostrava a imensidão do mar. Antítese: Você me diz que não concorda, pois viu uma foto, diferente da que eu vi, onde pode-se ver muito verde. Síntese: Vendo as duas fotos, concluímos, então, que o mundo é azul e verde e unimos nossas opiniões em uma só.


Contudo, a dialética é um ciclo eterno. Nossa síntese é transformada novamente em tese quando uma terceira pessoa apresenta uma antítese à ela. A antítese, no caso, é a opinião de que o planeta possui desertos, nuvens e montanhas vulcânicas que, pela imensidão, tornariam-se, claramente, visíveis do espaço. Concordando com essa pessoa, formaríamos mais uma síntese de que o mundo é azul, verde, branco e marrom. E essa síntese pode novamente virar uma tese e assim por diante…


Essa foi uma forma grotesca de explicação, mas espero que tenha sido compreendido. E, olhando pelo exemplo acima, fica fácil enxergar uma extrema beleza na dialética, no debate humano que estrutura nossa eterna busca por respostas, compartilhando opinião e conhecimento para construir nossas torres de sabedoria.


Mas nem tudo é um mar de rosas. A arte de discutir monta um ciclo infinito e, portanto, sempre mutável. Nossas “irrefutáveis” sínteses de hoje podem se tornar frágeis teses amanhã: “a terra é plana”, “a terra é o centro do universo”, “existem vários deuses”, “existe somente um deus”, “solitárias são um excelente remédio de emagrecimento”, “o homem não pode voar”… quem nos garante que nossas certezas de hoje não serão descartadas num futuro próximo?


E essas “certezas” acabam deixando a dialética de lado. O mundo está repleto de “donos da verdade”, e essas pessoas matam, intimidam, e arrasam civilizações para impor sua opinião como verdade. Mas num conceito mais pacífico, nas próprias discussões, vemos a imposição de opiniões. Faz parte de nossa natureza ou talvez da nossa cultura, mas está presente, sempre presente, a necessidade de “ter razão”, o medo de se ferir o orgulho ao ser contrariado; a vergonha, estruturada em nossa estúpida preocupação de como somos vistos pelas outras pessoas ao presenciarem nossas “teses”sendo derrubadas por “antíteses” alheias.


Não somos obrigados a acatar a opinião contrária, mas devíamos — e isso é muito difícil — compreender em que nosso opositor se baseou para chegar àquela opinião e, assim, com certeza, aprenderíamos muito mais, debateríamos de forma mais saudável, acrescentado conhecimento e compreensão à nós mesmos.


A Erística

Com a já citada necessidade de “ter razão” os debates muitas vezes deixam de ser acontecimentos enriquecedores e se tornam uma batalha. É aí que entra o “lado negro” da dialética, que podemos exemplificar bem com a Erística.


A Erística é a técnica de debate onde não se busca um consenso ou a “verdade” mas, simplesmente, vencer a discussão. Bem resumido em “Vencer um debate, mesmo sem ter razão”. É a vitória a qualquer custo.


Já elaborada na Grécia antiga e bem definida no tratado de Schopenhauer intitulado “A Dialética Erística”, essa técnica de debate se tornou um dos alicerces de nossa sociedade. Tiranos, charlatões e até mesmo grandes filósofos a utilizaram para movimentar as massas.


Vejo a Erística como a energia nuclear da dialética: pode ser usada para o bem ou para o mal.


A fútil guerra de egos

É muito difícil para nós, reles animais, abandonar certos conceitos, certos instintos e, principalmente, o orgulho — Lembram-se que já foi permitido “matar pela honra”? Perguntem aos seus pais/avós.


Para o crescimento intelectual, humano e social, é necessário abrirmos mão de muitas coisas — desnecessárias, diga-se de passagem — para que consigamos dizer naturalmente “eu errei”, “eu não sei”, “poderia me ensinar?”.


A dialética se mostra bela e fundamental para nós, como espécie coletiva que busca o crescimento. Mas é preciso aceitar que ela é eternamente mutável. É preciso ceder ao fato de que se lhe aplaudem hoje pela sua opinião, amanhã poderão lhe contradizer e, dependendo, você precisará aceitar, abrir mão do obsoleto para agregar ideias alheias. Tudo isso só te fará bem. Mas ao se chocar com mal, com o banal e com o errôneo, debata! Muitas vezes você descobrirá que estava errado em considerar aquilo banal ou simplesmente apagará um pouco da banalidade. Basta que todos saibamos discutir, usufruir e nos enriquecer com essa maravilhosa arte.

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