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Foto do escritorChristian Gurtner

As Bruxas de Salem e o dia das mulheres

Atualizado: 25 de jun. de 2021


Era o ano de 1689. A caça as bruxas na Europa estava praticamente extinta. A segunda versão da inquisição, iniciada no século XV e concentrada na Espanha, já não buscava feiticeiras diabólicas e sim os judeus e os recém convertidos ao cristianismo.

Enquanto isso, no novo mundo, os britânicos haviam iniciado uma guerra contra os franceses nas colônias americanas. Várias regiões, como Nova York e Nova Escócia foram devastadas, gerando uma grande migração de refugiados.


Boa parte desses refugiados foi para a Colônia da Baía de Massachusetts, em um vilarejo chamado Salem. chegada dos imigrantes gerou uma grande tensão, aumentando a já existente rivalidade entre as famílias que disputavam as riquezas do porto.


Naquele mesmo ano, assumia o primeiro sacerdote do vilarejo, o Reverendo Samuel Parris. Muita controvérsia foi gerada por sua nomeação, devido ao modo rígido como tratava os assuntos da igreja e sua natureza gananciosa.


E foi justamente na família do reverendo, que, em 1692, algo anormal acontece. Sua filha de 9 anos e sobrinha de 11, começam a se contorcer e fazer barulhos estranhos, jogar objetos pela casa e gritar. Um dos médicos locais afirmou se tratar de algo sobrenatural.


Sob pressão de alguns magistrados as crianças acusaram três mulheres de serem as responsáveis por aquele evento paranormal contra elas: a escrava caribenha da casa, chamada Tituba, uma mendiga, chamada Sarah Good e uma anciã pobre, de nome Sarah Osborne. As três foram presas.


Com esse acontecimento, o gatilho para um evento que misturaria o sobrenatural com a ganância, a maldade e a injustiça humana havia sido disparado.


As três mulheres foram interrogadas por vários dias. Uma delas, a escrava, por algum motivo confessou ter assinado um pacto com o demônio. E ainda afirmou que havia várias outras bruxas no vilarejo com a missão de destruir os puritanos.


A semente da paranóia havia sido plantada. Nos meses seguintes várias pessoas sob acusação de bruxaria foram presas. Em maio de 1692 um tribunal especial foi criado para julgar esses casos e, em junho, o primeiro enforcamento pelo crime de bruxaria é executado.


Alguns dias depois, ministros da igreja pedem que não sejam usadas evidências espectrais nos julgamentos. Esse tipo de evidência se baseava em sonhos ou visões que as testemunhas ou vítimas tiveram. Ou seja, bastava sonhar ou falar que teve uma visão de determinada pessoa fazendo bruxaria que tal pessoa ia presa.


Com isso, vinganças, inveja, concorrência, dinheiro ou ciúme tornaram-se motivos para uns acusarem os outros de bruxaria.


Dezenove pessoas foram enforcadas, um homem de 71 anos prensado até a morte e várias outras pessoas morreram na prisão.


O Governador, vendo sua própria esposa ser investigada, acabou proibindo o uso de evidência espectral e também novas prisões. Posteriormente todos os acusados presos foram soltos e a caça as bruxas encerrada.


Com o tempo, o juiz responsável pela maioria das condenações assumiu que estava errado. Em 1702 a corte declara todos os julgamentos de Salem como ilegais e alguns anos depois os herdeiros das vítimas daquela caça as bruxas recebem uma indenização da colonia.


Mas foi somente em 1957 que o estado de Massachusetts pediu oficialmente desculpas pelos fatídicos eventos de 1692.


Os Julgamentos de Salem mostram um triste retrato de nossa sociedade em relação as mulheres. Mais de 70% dos condenados eram mulheres. Já os homens que eram acusados, normalmente era devido a proximidade ou relação que tinham com alguma mulher acusada.


O motivo disso foram os moldes machistas que criaram uma subfunção para as mulheres. E aquelas que não representassem bem esse papel, passavam a ser malvistas.


Não se sabe ao certo quando e por quê, a mulher passou a ser discriminada na sociedade. Mas descobriu-se que no período neolítico isso não acontecia. Homens e mulheres tinham suas funções e um dependia do outro. Todos tinham voz de decisão, e muitas evidências apontam que esses princípios igualitários eram uma vantagem para a sobrevivência e também para a sociedade e evolução humanas.

 

O dia 8 de março é o dia da mulher. Dia de parabenizar as parentes, amigas e namoradas e enviar mensagens melosas para todos os grupos e contatos do Whatsapp, email, Facebook e Instagram.


As pessoas parecem esquecer que esse dia não é um dia de comemoração. É um dia de vergonha, de ver como ainda somos primitivos e refletir sobre isso.


O dia da mulher existe pelo mesmo motivo que existem os dias/semanas da consciência negra, LGBT, dentre outros, cujo fim é nos lembrar todos os anos que ainda vivemos em uma sociedade, machista, preconceituosa, injusta e com um abismo social inacreditável, ou seja, em uma sociedade primitiva sustentada pela ignorância.

Com origens socio-culturais e religiosas, a discriminação sexual ainda resulta para as mulheres em desigualdade salarial, abusos físicos e psicológicos nas ruas e em casa e misoginia.


Hoje não é dia de parabenizar. É dia de pedir desculpas e prometer o nosso melhor possível para que, quem sabe, não aprendemos algo com aqueles homens das cavernas neolíticos e não precisemos mais desses e outros lembretes anuais.

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